Â鶹ÊÓƵ

Abertura 32º Inverno Cultural Â鶹ÊÓƵ: a cultura resiste!

Publicada em 23/08/2021

Na tarde do sábado, 21, foi aberta a 32ª edição do Inverno Cultural Â鶹ÊÓƵ, a primeira em sua história realizada integralmente em formato on-line. Foi um momento muito significativo para os artistas envolvidos e para a Universidade, que não pode deixar de ressaltar a relevância de saudar a arte e a comunidade indígena Krahô.

Em sua fala, o coordenador do festival e pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários, Chico Brinatti, ponderou: “Num país que não respeita os povos originários, com os indígenas sendo bombardeados na porta da Funai, é extremamente importante discutir esse tema. O ataque a esses povos é um ataque ao meio ambiente e à própria cultura brasileira.”

A aprovação do PL 490, que altera as regras de demarcação dos territórios indígenas, mostra como é crítico o cenário para esses povos: os direitos garantidos pela Constituição estão regredindo. “Que essa edição nos possibilite a reflexão de tudo por que passamos. Que possamos nos inspirar e somar esforços na luta dos povos indígenas. Que possamos aprender com eles”, afirmou o reitor Marcelo Andrade. É extremamente necessário, nas palavras do reitor, reafirmar a cultura como essencial para a sociedade, “ainda mais num momento em que cultura e a ciência têm sido constantemente negadas.”

A sabedoria do Hotxuá
A presença de Ismael Ahprak, o Hotxuá do povo Krahô, era uma grande expectativa para a cerimônia. O tão aguardado encontro, contudo, não se realizou ao vivo, pois Ismael estava de partida para Brasília, onde vai participar do ato de reivindicação pelos direitos das tribos indígenas. O sacerdote do riso gravou uma conversa com o “Seo Chico”: falas emocionantes, repletas de sabedoria ancestral.

O coordenador do Inverno quis saber como Ismael percebia ser preciso fazer alguém rir. “Quando a gente tá muito caladinha, a gente brinca, faz rir. Você chega num grupo falando diferente, já fazendo barulho, a pessoa não pode ficar sem alegria, quietinha, pensando em não sei o quê”, ensinou o xamã.

“O que você faz quando está triste, Ismael?” Tenta fazer os outros rirem, o que lhe traz muita alegria, e é bom para ele mesmo, porque não fica zangado e nem triste. Para o Hotxuá, é fundamental levar a alegria para a família, para os filhos e netos, ninguém pode ficar sem rir dentro de casa.

Ao vivo, na mesa de abertura do festival, Samuel Ahprak, filho de Ismael, mostrou algumas brincadeiras (forma com que se referem a jogos cômicos e mímicas) feitas durante a festa da batata. “O Hotxuá só brinca no ritual de batata”, diz Samuel, explicando que o pai é além dessa figura ritualística: ele é um Mekhen, uma espécie de bufão, que tem a liberdade absoluta de brincar e de criticar, ele é a própria comicidade.

Samuel conta que se escolhe bem pequena a criança que futuramente será um Hotxuá, para que ela vá assimilando as brincadeiras desde o começo. Foi assim com ele e seu pai, e Samuel sabe que ainda tem muito a aprender sobre como ser Hotxuá. E assim será com seu filho, que um dia também será xamã do riso.

Ismael Ahprak, o Mekhen, representa a alegria sim, mas também promove a cura e a sabedoria pelo riso. No documentário, dirigido por Letícia Sabatella e Gringo Cardia, quando Ismael sobe na árvore e quase cai, e toda a comunidade ri, ele está mostrando como não se deve subir. É uma forma de aprender com os “erros bobos” – é como se, apenas existindo, Ismael ensinasse, por meio do riso, um modo de instruir-se em coletividade.

Ismael e a mãe-terra
Ismael tem também outra atribuição importante: escolher o que plantar e o melhor local para os cultivos. O que se liga às origens da tribo, pois, segundo a lenda dos Krahô, o Hotxuá nasceu da abóbora, sua essência veio da terra. Logo, ele é a ancestralidade, é quem compreende a realidade em que a comunidade vive. Ao perceber que numa cultura as raízes de suas crenças vêm da natureza, entende-se como essa relação da tribo com a terra é mais que necessária, é divina.

Por esse motivo, a expressão corporal de Ismael mudou completamente ao falar sobre a defesa do território Krahô. Os fazendeiros estão apertando seu povo, que a cada dia fica com um espaço menor, o que é errado, é ruim. “A cultura que a gente faz não pode acabar, a cultura dos Krahô tem que ser levada mais pra frente”, justifica Ahprak.

O comprometimento com essa luta encerrou a conversa: o Hotxuá se despediu, porque o carro o esperava para a viagem a Brasília – rir e lutar é preciso. Como é preciso que as portas das instituições públicas de Educação estejam abertas para a sabedoria dos povos originários. Para que essa troca de saberes enriqueça a resistência, e população indígena (r)exista.

Se você perdeu esse encontro, não deixe de no canal da TV Â鶹ÊÓƵ no YouTube! Um bom Inverno Cultural para todos!

 

Texto: Luiza Cassiano